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segunda-feira, 10 de março de 2014

Crônicas da Luci - o bode, a cabra, um cão pastor no meio do meu caminho e 3 km de chão até chegar o vilarejo - GUİA DO MONTANHÊS

Olá pessoal,

Esse é mais um post rural. Dias atrás eu decidi ir pra cidade - boas horas depois do meu marido ter saído de casa. Fazia um frio, com um vento de doer a alma mas mesmo assim eu decidi deixar o recesso do meu lar pra mexer um pouco o esqueleto e ir resolver meus assuntos na cidade.

Eu odeio depender dos outros, e nesse ponto não saber dirigir me atrapalha bastante.

Enfim, me vesti com tudo o que pudesse me isolar termicamente falando, cachecol, gorro. Sim, parecia que eu estava indo para o Alasca ...

Coloquei o fone de ouvido e fui me embora com a trilha sonora do "Senhor dos Anéis" - as vezes me sinto morando em Valfenda ou na vila dos Hobbits.

Passei pela propriedade do vizinho, e vi que ele estava lá - ao menos o carro velho estava em frente do portão. Como não vi sinal dele, decidi continuar minha caminhada. "Desta vez não dei sorte" - pensei.

Vi um pobre rouxinol de peito laranja esbagaçado - provavelmente vítima de atropelamento. Triste, vira e mexe acontece isso, um esquilo morto aqui, uma cobra ali...

Tirei um dos fones do ouvido pra não ser pega de surpresa por algum carro que passasse e se desgovernasse. Sempre ia caminhando pelo canto, longe do ponto cego da curva mas nunca se sabe ...

Antes que eu passasse a base da OTAN, levantei a cabeça como quem sente algo vivo se aproximando. E, detrás da moita saiu um Kangal todo alaranjado, de orelhas e rabo cortado como um pitbull.

Ele parou, em silêncio, a uns 10 metros de mim e ficou me fitando. Tinha a cor de um leão!

Estendi meu olhar e vi um grupo de cabras e bodes pastando a uns 50 metros atrás dele, indo na mesma direção que eu queria ir. E o cão pastor estava lá, disposto a não me deixar me aproximar das suas protegidas.

Dei um passo, ele deu dois avançando pro meio do caminho.

"- Daqui você não passa." - foi o que eu entendi.

O vento começava a soprar mais forte e gelado, como se cortasse meu rosto. Minha nuca se arrepiou toda então cobri a cabeça com o capuz felpudo do casaco que usava.

Olhei em volta. Pedras ... não seria a primeira vez que me valeria delas para me defender de um cachorro naquela mesma estrada. Mas aquele não era um vira-lata qualquer: era um Kangal, ao menos um híbrido e era um cão de trabalho, habituado a defender a criação de seu mestre de raposas, lobos e javalis.

Eu não seria páreo para ele...

Vi dois soldados no campinho da OTAN, longe ... bem longe e atrás de grades e grades.

O cão correu em direção às cabras, se distanciando. Mas, mais uma vez parou e ficou me olhando.

Eu continuei parada, respirando e pensando no que fazer. Voltar pra casa depois de ter percorrido todo aquele caminho iria atrasar minha programação. Decidi esperar o rebanho avançar e assim seguiria meu caminho quando eles me perdessem de vista.

Mas o animal resolve voltar, passinho diante de passinho. Como um leão calculando quando seria o melhor momento de se lançar sobre a gazela ...

Nesse instante eu vejo o velho carro branco do meu vizinho. Fiz sinal pedindo carona mas, por estar usando o capuz ele não me reconheceu. Arranquei o capuz desesperada e balançando cada vez mais os braços.

Ele freou, quase passando de mim.

- Que bom que você veio! - abri a porta, sorrindo.

Esse vizinho vira e mexe está saindo quando eu estou passando em frente à sua propriedade, mas daquela vez o destino quis que eu tivesse um pouco de adrenalina.
Daquela vez Deus queria me mostrar que Ele estava lá comigo e ia dar um jeito.

Depois, olhando mais uma vez pro animal, percebi que ele era muito parecido com meu falecido Aslan. Talvez se lembrasse que eu o tirei da placenta quando nasceu ... não sei, não quis testar. Ao menos não daquela vez ...